O filme La Caduta Degli Dei - a Queda dos Deuses - realizado em 1969 é uma das obras-primas de Luchino Visconti. Os Deuses Malditos, aqui no Brasil, é a saga de uma família aristocrata alemã da industria do aço no período do nazismo, a família Krupp, uma dinastia de 400 anos de Essen.
O título é magistral, sintetiza perfeitamente o filme e a situação histórica. Mesmo assim há de se perguntar por que Visconti escolheu este título, A Queda dos Deuses. Afinal os Krupp não caíram, não perderam, muito pelo contrário se beneficiaram tremendamente com a guerra. O grupo econômico ThyssenKrupp continua fazendo parte de nossas vidas até hoje em diversos ramos multinacionais. Que deuses malditos caíram?
Albert Speer ( pronuncia-se ischpéar) foi o arquiteto preferido de Hitler.
Brilhante, culto e sofisticado Speer criou obras belíssimas, prédios monumentais e desenvolveu um novo plano urbanístico para Berlin. Como cenógrafo criou os espetáculos de luzes e movimentos humanos que fizeram dos comícios nazistas obras de arte de Leni Riefenstahl. Ironicamente um desses filmes, O Triunfo da Vontade, foi premiado em Paris. Antes da guerra é claro.
Speer foi um administrador brilhante. Como Ministro do Armamento foi responsável pela coordenação da industria alemã no esforço de guerra. No fim, já desiludido com a loucura do Führer, Speer estava na lista dos conspiradores da Operação Valquíria liderada por Von Stauffenberg para matar Hitler.
Speer foi um dos poucos acusados a ter a vida poupada no Julgamento de Nuremberg, assumiu toda a responsabilidade por seus atos, cumpriu pena de 20 anos em Spandau e depois publicou dois best-sellers. Churchill reservadamente o chamava de “o bom nazista”.
Quando Hitler no fim da guerra ordenou a Operação Nero, a política de terra arrasada para destruir o que ainda restava da Alemanha, Speer se opôs executar as ordens do Führer. Ele estava decidido a salvar o que fosse possível do país. Um dos maiores patrimônios da Alemanha era e é, a Filarmônica de Berlin. Apesar do bombardeio devastador sobre a cidade a orquestra continuava tocando regularmente de três a quatro vezes por semana.
Semanas antes da rendição incondicional e da ocupação da cidade pelo Exercito Vermelho, Speer já vinha providenciando a retirada dos melhores pianos, das harpas, das tubas wagnerianas, das partituras e até dos smokings dos músicos. Mas faltava retira-los. Esta era a parte mais complicada.
Speer não tinha a menor intenção de deixar o corpo dos músicos da Filarmônica cair nas mãos dos russos, mas também não arriscar se os Aliados chegariam a Berlin.
Por outro lado retirar muito cedo da cidade os 105 músicos da orquestra chamaria a atenção de Goebbels. O ponto crítico era decidir o momento de retirar as dezenas de músicos e como dar para eles o sinal para a partida.
Speer criou uma estratégia e combinou que daria uma senha para avisar à orquestra que era chegada a hora da fuga. A senha seria uma alteração de última hora na programação do espetáculo. Pelo plano de Speer todos deveriam sair de uma só vez à noite, imediatamente após a apresentação da orquestra e tomar os ônibus que ele providenciaria para a retirada. Os ônibus ficariam estacionados na escuridão do lado de fora do Beethoven Hall. A senha para a fuga seria uma música a ser escolhida pelo próprio Speer para encerrar o espetáculo que só seria informada pelo diretor da orquestra ao maestro durante a própria apresentação.
Na noite escolhida, 12 de Abril de 1945, Speer estava sentado na platéia em seu lugar habitual. No palco os músicos trajavam ternos escuros ao invés dos smokings habituais que já estavam escondidos. Na platéia só ele sabia o motivo. Momentos antes de terminar a apresentação Speer enviou seu assistente para informar ao diretor da orquestra Von Westermann e a ao regente Gehrard Taschner uma alteração no programa. A música escolhida para finalizar o espetáculo. Von Westermann ficou surpreso com a escolha:
– Você sabe perfeitamente que esta música representa a morte dos deuses, a destruição do Valhalla e o fim do mundo. Tem certeza que é isso que o ministro ordenou?
Não havia nenhuma dúvida. Para a última apresentação da Filarmônica de Berlin, Albert Speer havia escolhido Die Götterdämmerung.
O Crepúsculo dos Deuses, de Wagner.