Baguettes, Pizzas, Fogazzas.

Adoro pão. Principalmente com manteiga ou azeite. Parece simplório, mas há centenas deles para experimentar. Mais de 250 na França, mais de 400 na Alemanha. O que mais gosto é justamente o mais comum, a baguette francesa.

Próximo da Côte D’Azur a poucos minutos de Cannes há uma pequena vila medieval, Mougins. Pronuncia-se mujã. A vila não tem mais que vinte mil habitantes. Jean Cocteau, o cineasta, Winston Churchill e Christian Dior eram assíduos. Picasso passou lá seus últimos 15 anos de vida. O Mediterrâneo à frente, os Alpes de um lado, a Provence do outro. Mougins é idílica, colorida, perfumada, cercada de campos de flores e florestas.

A vila tem muitas galerias de arte, restaurantes fantásticos, a melhor culinária provençal no Moulin de Mougins. Mas para mim Mougins tem algo a mais. O Hotel de Mougins na Avenue de Golf. O hotel é charmosíssimo, todo ele térreo, as suítes com varandas voltadas para os jardins interiores. O hotel guarda um segredo, uma delícia, um pecado. O melhor pão que já provei em toda a Europa.

Durante dias, no café da manhã, eu quase acabava com as baguettes do hotel.
Minha mulher não entendia como eu podia deixar de degustar uma mesa fartíssima de bolos, crepes, presuntos, salames, queijos, patês, tartes, quiches e mais uma montanha de iguarias francesas. Só tinha olhos, digo paladar, paras as baguettes. Sabia que tudo o mais poderia encontrar em outros lugares mas aquelas baguettes eram únicas. O garçom estranhava. Minha mulher se horrorizava.

Pior aconteceu muito tempo depois em outra viagem, em Gênova com umas fogazzas.
Estávamos de passagem vindo de Saint Moritz em direção a Nice. Ficamos em Gênova apenas um dia para jantar numa pizzaria famosa numa escarpa na Via Quarto ou Quinto, debruçada no Mediterrâneo. Também havia o Pesto, o original, o liguri. A região de Gênova Pra a Gênova Pegli tem a terra e as condições ideais para o manjericão atingir o perfeito equilíbrio de perfume e sabor.

Ainda não chegamos nas fogazzas, ainda estamos nas pizzas.
Estamos todos, mulher e crianças na pizzaria. Enquanto discutíamos o cardápio um senhor se aproximou curioso. Calado nos ouviu por um momento, sorriu e foi embora.
Logo o som ambiente que estava baixo ficou mais alto. Começou a tocar um samba, um enredo de escola de samba. Mais precisamente da Portela.

O tal senhor retorna sorridente e se apresenta como o dono da pizzaria.
Um italiano que tinha vivido o suficiente no Rio para ali mesmo na nossa frente, na frente das crianças, sem a menor cerimônia se emocionar. Sem nenhum recato se confessou Portelense fanático. Sem nenhum constrangimento, ao saber que sou carioca, sentou-se à nossa mesa. Ao saber que também torço pela azul e branco me levantou da cadeira. Sem o menor pudor me abraçou, pediu para jantar conosco.

O homem estragou nosso jantar. Destruiu nossa noite.
Pedia pizzas e mais pizzas, calzones, cornicciones, cobellettis, especialidades, azeites raros da Ligúria. Dava gritos e mais gritos para o pizzaiolo que estava comandando o forno aberto. O que era para ter sido uma noite tipicamente italiana, à beira do Mediterrâneo, comendo pizzas e pastas al pesto se transformou num desfile de sambas da Portela.
Mas afinal talvez tenha sido uma noite tipicamente italiana. Emotivamente italiana.

Mas vamos às fogazzas.
Na manhã seguinte fomos bem cedo tomar café da manhã no restaurante do hotel. Tínhamos pressa para pegar a estrada para Nice. É perto, uns duzentos quilômetros, mas queríamos parar um pouco em Mônaco antes de chegarmos na hora do almoço num daqueles restaurantes populares, de pescadores, lá em Nice.
Fomos nos servir. Vi uma bandeja com massa assada de fogazza. Experimentei em pé mesmo. Uma perdição. Repeti tantas vezes que a fogazza acabou.

O Chef, visitando o salão, ao notar a bandeja vazia fez uma cara estranha. Como só havíamos nós acho que ele duvidou que tivesse servido a fogazza. Trouxe mais. Elas acabaram novamente. O pobre homem estava desorientado. As fogazzas desapareciam misteriosamente.
Acabei sendo pego em flagrante. Ele riu satisfeito.