Olhos Castanhos

De todos os meus filhos, quando eram bebês, foi com a Taanit que eu tive a relação mais intensa.
Assisti ao parto dela. Quando estava sendo delivrada pela obstetra, notei que ela estava laçada. O cordão umbilical estava em volta do pescoço. A obstetra não percebeu e continuou a tirá-la. Um absurdo inconcebível.

Não hesitei, interferi imediatamente e fiz a manobra correta livrando o laço. A médica se surpreendeu, me olhou, entendeu e agradeceu. A vida de nosso bebê estivera em perigo.
Ela nasceu em finais de Novembro em Lisboa. Quando voltamos para nossa casa em Sintra, talvez por causa da mudança de estação, de Outono para Inverno, ela adoeceu. Ficou severamente resfriada, talvez gripada, ou como preferem os portugueses, constipada. O fato é que ela começou a formar muito muco nos pulmões, o que lhe impedia de respirar. Apesar da medicação o quadro permaneceu por quase dois meses.

Neste período usei uma técnica para lhe facilitar a respiração. Com minha boca aspirava-lhe o nariz. Aspirava e cuspia, aspirava e cuspia até limpar suas vias respiratórias. Depois desta manobra, finalizava com mais outra. Com uma mão tapava-lhe a boca, com a outra tapava-lhe o nariz. Depois de um curto período que lhe impedia de respirar, eu tirava a mão que lhe tapava o nariz, mantendo a que lhe tapava a boca. Ansiosa por respirar ela aspirava com força pelo nariz terminando de limpar as vias.

Claro que depois ela chorava muito, o que era um excelente exercício para os pulmões. Eu então lhe acalmava, lhe enchia de beijos e carinho. Ela se sentia aliviada parecia entender e me olhava com doçura. A manobra lhe limpava as vias e lhe deixava respirar livremente até quando o organismo produzisse mais muco. Quando eu percebia que ela estava novamente com dificuldades para respirar repetia a manobra. Isto acontecia várias vezes durante o dia e durante a noite. Durante semanas a fio.

Eu sofria com ela, isso nos deixava incrivelmente próximos e eu acompanhava de muito perto sua luta pela vida. Nunca tive uma experiência tão intensa, tão próxima com um filho. Ela parecia entender o que eu fazia e me olhava com uma doçura emocionante. Tudo isso passou é claro. Tudo se normalizou, ela cresceu muito forte e saudável. Mas até hoje ela retêm aquele olhar doce e meigo.

De todos os meus filhos ela é a que mais doçura tem no olhar. Por sinal uns lindos olhos castanhos esverdeados. Esta portuguesinha tem uns olhos castanhos, de encantos tamanhos, estrelas fulgentes, brilhantes, luzentes, caídas do céu. Risonhos, de encantos tamanhos são raios de luz.