Low Fares

Quando David Neeleman criou em 1999 a Jet Blue, a primeira low-fares airline, em Nova Iorque, ninguém imaginou a revolução que estava se iniciando. A partir daí surgiram e proliferaram as empresas aéreas de baixo custo. 
Uma revolução nos transportes, no lazer e nos negócios que levou a uma mudança nos hábitos e costumes contemporâneos.

David, que é filho de holandeses, nasceu no Brasil e ficou aqui até aos cinco anos quando a família se mudou para os Estados Unidos. Hoje ele está de volta ao e fundou a Azul nos mesmo moldes da pioneira Jet Blue.
O conceito é simples.
Padronização da frota, usando um só tipo de aeronave, para baixar os custos de manutenção e treinamento. Serviço mínimo de bordo, que além diminuir custos aumenta a disponibilidade de espaço para transporte de cargas pagas. Baixos salários e forte espírito de equipe.
Mas principalmente e acima de tudo planejamento de rotas para uso intensivo da aeronave com o mínimo de tempo no solo.
Afinal lugar de avião ganhar dinheiro é lá em cima.

Os aviões da Jet Blue não passam mais de trinta minutos no solo. Houve anos em que eles alcançaram a média recorde de vinte e sete minutos de permanência nos aeroportos.
Mesmo empresas européias tradicionais como a British Airways, Lufthansa, KLM e Air France tiveram que se adaptar e oferecer tarifas flexíveis para enfrentar a concorrência das novatas como Air Lingus e Ryanair, moldadas no conceito de low-fares da Jet Blue.

A Ryanair tem preços absurdamente baixos.
Mas paga-se por qualquer extra: check-in real, lanche à bordo e bagagem de mão. Atendimento? Telefones à cobrar.
Durante o vôo os ecrans anunciam promoções e produtos diversos; o vôo é uma feira onde as aeromoças/vendedoras vendem de tudo. 
Há estudos da empresa para mudar os assentos e transforma-los em bancos de apoio altos para se viajar quase em pé e aumentar a capacidade do avião.
E por fim a wee-fee, a taxa do pipi. Banheiro pago. Só um irlândes como O'Leary poderia pensar nisso.

Hoje parece distante o tempo quando viajar de avião era um privliégio cheio de charme e para poucos. Serviço de bordo de primeira, bebidas à vontade, aeromoças elegantes que povoavam as fantasias masculinas e inspiraram musicas. 
Tudo isso parece coisa de um passado no mínimo romântico.
Claro que ainda há nichos de mercado ocupados por companhias como a Emirates onde existem confortos e luxos muito maiores que antigamente. Cabines individuais com camas horizontais e banheiro com ducha, discotecas, bares, salas de massagem e de ginástica.
Mas a regra é o transporte popular. 

Viajar de avião é de longe mais barato que viajar de carro, trem ou ônibus. Mesmo que para que isso sejam servidas apenas algumas barrinhas de cereais ou uns pacotinhos de amendoins.
Parece difícil de acreditar que se podia viajar regularmente, pagando apenas 20% a mais da tarifa normal, na primeira classe de um jumbo da Varig, um Boeing-747 de dois andares, em um vôo curto de pouco mais de duas horas de Salvador para São Paulo. 
No vôo, atendido por um garçon e um maître, duas ou três opções de refeição eram servidas em pratos de porcelana, talheres de prata, acompanhados por uma razoável escolha de vinhos servidos em taças. Depois sobremesas e licores. 
Se é dificil de acreditar num vôo como esse, mais difícil é acreditar que alguém olhasse para a planilha de custos.

Viajando de Berlin para Londres embarquei no Tegel num vôo curto da British Airways; quase uma ponte aérea.
À medida que os passageiros entravam notei entre nós uma menina bem jovem, hippie, vestida com aquelas roupas características.
Havia de tudo no avião. 
Executivos de gravata, jovens de mochila, operários com roupa suja de trabalho, famílias inteiras e esta hippie com uma criança no colo.
Todos acomodados, portas fechadas, avião taxiando, cabeceira da pista, motores a toda, decolagem, subida acentuada e pronto. Velocidade de cruzeiro, vôo normal.
Nem tanto.

A criança que estava com a hippie começou a enjoar e de repente blarghh!
Vomitou tudo e todos em volta.
As aeromoças apareceram para ajudar. A menina hippie levantou-se levando a criança em direção ao toalete. Uma das aeromoças limpava as poltronas e auxiliava os passageiros enquanto a outra limpava o chão. 
Eu observava tudo a duas filas de distancia, aliviado por meu Armani não ter ficado perto do blargh. Em pouco tempo tudo se normalizou.

Eis que a menina hippie volta.
Ela tinha se limpado e lavado a criança que agora estava envolta nuns trapos. Todas as roupas sujas ela tinha lavado no toalete e as trazia nos braços.
Ela aproximou-se da poltrona e sentou a criança nela. Colocou o cinto na criança, levantou-se e começou a abrir os maleiros que ficam por cima das filas de poltronas. Abriu um por um.
Na borda de cada maleiro que abria ela colocava uma das roupas que tinha lavado. Fechava a tampa e a roupa ficava presa, pendurada.
E assim ela foi abrindo e fechando os maleiros, pendurando todas as roupas que tinha acabado de lavar. Colocou todas, as roupas intimas inclusive, todas penduradas ao longo do corredor acima da cabeça dos passageiros.

O 757 da BA seguiu até o Heathrow com o corredor transformado em varal de roupas.
Nínguem disse nada.