Mohammed ibn Ammar foi um árabe pobre cujos pais tinham emigrado do norte da África para a Europa. Ibn Ammar era poeta e queria continuar assim. Um poeta. Só um poeta, nada mais que um poeta.
Ele pretendia estudar para expandir seus talentos, mas os pais não podiam lhe sustentar. Como quase todo artista, Mohammed começou a procurar por um mecenas, por alguém que patrocinasse sua arte. Alguém que pagasse suas contas em troca de seus versos. Escreveu poemas a muitos ricos e poderosos, mas não recebeu muitos apoios.
Estamos no século XI. A Península Ibérica vivia os anos dourados do apogeu da civilização árabe.
Muhammad ibn 'Abbad al-Mu'tamid era o filho e herdeiro do Rei de Sevilha.
Muhammad ibn 'Abbad al-Mu'tamid era o filho e herdeiro do Rei de Sevilha.
Apesar de muito jovem o pai lhe reservava uma brilhante carreira tanto militar quanto política. Era em al-Mu'tamid que o rei depositava seus projetos mais ambiciosos de continuação da dinastia dos Abádidas.
Na altura o rei de Sevilha estava empreendendo uma ação militar contra os salteadores berberes que infestavam o al-Gharb, o atual Algarve, sul de Portugal. Ele aproveitou a oportunidade para colocar o filho à frente da ação militar.
Al-Mu'tamid era muito jovem para ser o comandante, mas o pai não perdeu a chance de prestigiar o filho, embora o trabalho fosse efetivamente realizado pelos militares de carreira. Após o sucesso militar da campanha o poeta ibn Ammar decidiu compor versos de exaltação ao filho do Califa, louvando as habilidades militares do Libertador do Algarve.
Ele continuava à procura de um patrocinador para sua arte. Seus versos foram enviados ao filho do rei.
Al-Mu'tamid adorou os poemas, os comprou por uma alta soma e quis conhecer o poeta que lhe cantava em tão belos versos. Mandou trazê-lo a Sevilha. Conheceram-se. O herdeiro caiu-se de amores.
Al-Mu'tamid apaixonou-se perdidamente pelo poeta. Apesar de ter apenas 12 anos na sua louca paixão entregou-se perdidamente a ele. Nesta altura o rei, sem saber do incendiário romance, entregou ao filho o governo de Sevilha. Uma das primeiras decisões de al-Mu'tamid foi nomear o amado como primeiro-ministro e governador de al-Gharb.
Al-Mu'tamid apaixonou-se perdidamente pelo poeta. Apesar de ter apenas 12 anos na sua louca paixão entregou-se perdidamente a ele. Nesta altura o rei, sem saber do incendiário romance, entregou ao filho o governo de Sevilha. Uma das primeiras decisões de al-Mu'tamid foi nomear o amado como primeiro-ministro e governador de al-Gharb.
O casal mudou-se para lá. Foram morar em Xelb, hoje Silves, o centro da cultura árabe, conhecida como a Bagdá do Ocidente. Chegaram e desfilaram à cavalo pelas ruas da cidade, aclamados pela multidão encantada com seu jovem libertador.
Loucamente apaixonados eles passaram a viver tórridos dias de amor e paixão desenfreada no paraíso semi-tropical da entrada do Mediterrâneo. Juntinhos eles não estavam nem aí para os comentários maldosos dos muçulmanos mais ortodoxos que não achavam a menor graça naquela luta de cimitarras entre o Príncipe e o Poeta debaixo do caliente sol algarvio.
As más línguas locais deram muitos apelidos a al-Mu'tamid. Por sua tenra idade e seu fogoso comportamento o mais suave deles na tradução mais elegante para o português atual seria o Viadinho do Algarve.
O Príncipe e o Poeta construíram muitos palácios.
No Palácio das Varandas o casal real reunia a corte para assistir a recitais de poesias, espetáculos de dança e promoviam banquetes regados a muito vinho. A restrição islâmica ao consumo de álcool tinha sido convenientemente relaxada. O príncipe dançava sensualmente para o poeta, a corte adorava. Os dois se amavam loucamente, publicamente, escandalosamente.
Muito religiosos, os dois não perdiam as sagradas orações diárias. Iam para a mesquita de mãos dadas e faziam suas orações em versos improvisados. Olhos nos olhos.
– Escute enquanto o Almuaden chama o povo para a oração, dizia o pequeno príncipe.
– E espere que deus lhe perdoe os seus muitos pecados, respondia o poeta-governador.
Muitos destes delicados poemas devotos ficaram famosos e entraram para a Literatura.
Quando o Rei de Sevilha descobriu que os dois estavam coabitando ficou escandalizado, ficou furioso. Tomado de imensa ira desfez o casal. Destitui o filho, chamou-o de volta à Sevilha e exilou o poeta para Saragoça no norte da Espanha.
E mais, castigo terrível. Numa suprema injúria ao filho, o bofe comprou-lhe uma linda escrava e condenou-o a se casar. Sim, a casar. Horror dos horrores. Imaginem.
Mas o tempo conspira pelos apaixonados. O amor sempre vence. Eis que o pai parte primeiro para o Jardim das Delícias.
O velho califa foi finalmente se deitar com as 72 huris “sobre leitos incrustados com pedras preciosas, frente a frente, onde lhes servirão jovens de frescores imortais com taças e jarras cheias de vinho que não lhes provocará dores de cabeça nem intoxicação, e frutas de sua predileção, e carne das aves que desejarem. E deles serão as huris de olhos escuros, castas como pérolas bem guardadas” como prometem os versículos 12 a 40 da Sutra 56 do Alcorão.
Agora al-Mu'tamid era o Rei de Sevilha. Seus mais recônditos desejos tinham de ser atendidos. O reencontro do casal foi emocionante. O amor sempre triunfa. Al-Mu'tamid embriagado de amor compôs para seu poeta amado:
Minh’alma quer-te com paixão
Ainda que haja nisso uma tortura
Alegre vai na ânsia da procura.
Que estranho ser difícil nossa ligação
Se os desejos d’ambos concordaram
Não te ocultes, oh jardim secreto:
Quero colher meu fruto predileto!
Moral da história: nem só de Sherazades vivem as Mil e Uma Noites.
Em seu doce idílio os dois nem iriam se importar com o cartoon publicado pelo jornal dinamarquês Jyllands-Posten em 30 de setembro de 2005. No cartoon que provocou uma crise internacional Maomé adverte aos homens-bomba que estão chegando no Céu,
– Stop, stop. Vi er løbet tør for Jomfruer. (Parem, parem. As virgens acabaram).
Mas a suprema vingança do casal apaixonado contra o califa invejoso pode estar no entendimento de Christoph Luxenberg. O professor alemão publicou Die Syro-Aramaische Lesart des Koran - Uma Leitura Sírio-Aramaica do Alcorão - onde defende a tese de que como o Alcorão não foi escrito apenas em árabe, mas numa mistura de dialetos aramaicos, muita coisa tem outro sentido.
A palavra Hur, que em árabe quer dizer Virgem em sírio significa Branca.
Assim, segundo Luxenberg, as castas huris de olhos castanhos descritas no Alcorão não seriam virgens. Na verdade são "uvas brancas secas" de "clareza cristalina".
Pobre califa. Coitados dos homens-bomba.
Assim, segundo Luxenberg, as castas huris de olhos castanhos descritas no Alcorão não seriam virgens. Na verdade são "uvas brancas secas" de "clareza cristalina".
Pobre califa. Coitados dos homens-bomba.
Os dinamarqueses precisam refazer o cartoon:
– Parem, parem. Não são virgens, são uvas brancas.