Quando nos mudamos do Brasil para Portugal em 1990 eu e minha mulher fomos morar em Lisboa. Lá chegando, ela, que é dentista, surpreendentemente encontrou, apesar de estar no sétimo mês de gravidez, uma clínica que imediatamente lhe deu trabalho.
O dono da clínica era um senhor de mais de 70 anos. Um simpático português de Chaves, da região de Trás-os-Montes, apaixonado pelo Brasil.
O sr. Armindo tinha emigrado para o Brasil na década de 1930. Aos 16 anos chegou ao Rio determinado a fazer fortuna. E fez.
Começou a vida dirigindo caminhão.
Trabalhou duro, além do que se possa imaginar, e se tornou um empresário bem sucedido no ramo de bebidas. Tanto na distribuição quanto na fabricação.
Casou-se, teve um filho e depois de décadas voltou a Portugal trazendo a família.
Fiquei muito amigo dele.
Via-o sempre, e freqüentemente tomávamos umas bicas (café), uns copos (de vinho) ou fazíamos juntos uns longos almoços. Quando já tínhamos mais intimidade lhe fiz a pergunta que me atiçava a curiosidade.
- "Seu" Armindo porque o senhor deu trabalho tão rapidamente a Sandra mesmo sem nos conhecer?
- Ahh...doutor Ivan, quando eu vi aquele casal tão bonito, e ela com uma barriga daquelas, eu pensei no quanto devo ao nosso Brasil.
"Seu" Armindo falava com um pouco de sotaque carioca e sempre tinha para contar umas histórias ótimas do Rio e de como foi enriquecendo no ramo de bebidas.
- Sou um carioca doutor! Mas também gosto muito do nordeste do Brasil. Além de produzir cachaça e vermouth eu também era representante da cachaça Pitú para todo o sul do Brasil. Em média a cada dois meses eu ia a Recife.
- Pitú? Interessante "seu" Armindo, quando eu tinha uns quatro anos minha familia morava em Recife. Por coincidência na rua em que morávamos éramos vizinhos de um diretor da Pitú. Chamava-se doutor Moacir, o senhor chegou a conhece-lo?
- Claro que conheci doutor Moacir! Éramos muito amigos e todas as vezes que eu viajava à Recife eu sempre ia à casa dele lá no bairro da Boa Vista.
- Pois “seu” Armindo era pro colo de doutor Moacir que eu fugia quando minha mãe brigava por eu ter aprontado alguma coisa lá em casa.
- O doutor então é aquele traquinas que sempre corria para o colo de doutor Moacir? Você é aquele Ivan?!
- Eu mesmo, o próprio.
- Doutor! Venha de lá um abraço. Eu já lhe carreguei muito no colo.