Meus filhos Astha e Klaus e eu estávamos passando umas férias numa das praias mais lindas que conheço. Tamandaré e Praia do Carneiros no litoral entre Pernambuco e Alagoas, logo depois de Porto de Galinhas, na Costa dos Corais.
Nem vale a pena descrever a beleza, a cor e os detalhes deste mini-paraíso.
Tem de ir lá viver.
Minha amiga Paula tinha nos emprestado uma casa gostosíssima, que fica a umas dezenas de metros do mar, enorme para apenas nós três.
Foram seguramente uma das melhores férias que já tive. Era fora da estação de turismo e tínhamos todo aquele paraíso inteiro literalmente para nós.
Muitas vezes naquele arco imenso de quilômetros de praia não havia mais que dez pessoas. Temperatura ótima, cor do mar inacreditável, uma paz que lavava a alma.
Na época Klaus tinha cinco e Astha quatro anos.
Nossa rotina era perfeita.
Acordávamos bem cedo e íamos para a praia, brincar na areia, surfar nas marolas, mergulhar com óculos, correr na praia, descobrir coisas, catar conchinhas, olhar os peixinhos nas piscinas naturais.
Antes das dez horas voltávamos para a casa. Tomávamos banho, colocávamos bermudas, eles ficavam assistindo televisão, jogando, brincando.
Eu tomava um gole de cachaça para abrir o apetite e ia cozinhar nosso almoço que dependia do que nosso pescador tivesse trazido naquele dia.
Numa das vezes que voltávamos da praia caiu uma daquelas chuvaradas rápidas, inesperadas e fortes do litoral. Eles nunca tinham sentido uma chuva assim, um toró, com pingos grandes e assim quentes.
Espantados eles não fugiram da chuva, olhavam para cima, pulavam e gritavam de alegria.
Depois do almoço, para mim regado a uma cervejinha, tirávamos todos um cochilo e acordávamos depois das três da tarde. Esperávamos o sol ficar mais suave e íamos de novo à praia para as mesmas brincadeiras.
Voltávamos depois do sol se pôr. No caminho de casa tomávamos um sorvete ou ficávamos a conversar com o casal dono de um mercadinho.
Banho tomado, enquanto os dois se divertiam com algum dos brinquedos que tínhamos levado, eu lia algum livro e depois preparava o jantar.
Ou mais comummente acendia a churrasqueira no jardim da frente da casa para assar carne, frango ou linguiças.
As noites eram claras e incrivelmente estreladas.
Ficávamos na varanda a contá-las, a esperar por estrelas cadentes, fazer os respectivos pedidos.
Eu então eu lhes contava histórias engraçadas. Muitas destas histórias nós íamos alterando, inventando e criando ali mesmo na hora, com os típicos personagens infantis: pássaros, lobos, peixes, fadas, magos, príncipes, bruxas dentro daquele imaginário das histórias de criança.
E naturalmente nos incluíamos e aos nossos conhecidos, nestas histórias. Ficava engraçado e muito criativo.
Astha criava e resolvia enredos, começos e finais.
Mudávamos cenas, discordávamos do destino dos personagens e às vezes chegávamos a impasses curiosos.
Havia de tudo: lobos-maus que se regeneravam, bruxas que viravam fadas, fadas que viravam bruxas, sapos que não queriam virar príncipes, princesas que queriam virar sapo, por aí...
Como a criação era coletiva gerava as mais absurdas situações, todas elas engraçadíssimas.
Alí já estava se gestando a escritora que Astha viria a ser no futuro.
E assim as noites e os dias iam se passando, agradáveis, divertidos, amorosos.
O único senão do lugar eram os mosquitos que apareciam à noite, o que nos levava a dormir todos no mesmo quarto, convenientemente fechado antes do escurecer, ar-condicionado ligado.
Nada que atrapalhasse nosso paraíso.
Dormíamos Klaus e eu em duas camas de solteiro e a Astha, apesar de já estar grandinha, num berço.
Na hora de dormir, depois dos beijinhos de boa-noite, todos dois queriam naturalmente vir para minha cama.
Eu respondia que não, cada um na sua cama, que uma cama não dava para três e que afinal cada um tinha a sua. Mesmo assim antes de adormecerem os dois sempre insistiam:
- Pai posso ir para sua cama?
-Não filho - ou filha - já combinamos que não, fique na sua cama - berço- e vamos dormir.
Astha, muito carinhosa e espertinha, não desistia.
Ficava bem quietinha no berço, esperava o Klaus dormir e então perguntava baixinho para não acorda-lo:
- Pai posso ir para sua cama, para lhe fazer carinho?
Dá pra recusar?